A Lei nº 14.596/2023 estabelece novas diretrizes para a regulamentação de preços de transferência no Brasil, com o objetivo de alinhar a legislação tributária nacional às normas internacionais, em especial às diretrizes da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE).
Essa legislação visa garantir que as transações realizadas entre empresas de um mesmo grupo, mas situadas em jurisdições fiscais diferentes, sejam precificadas de forma justa, ou seja, como se fossem realizadas entre partes independentes, em conformidade com o princípio do arm’s length.
Conforme dito anteriormente, o preço de transferência refere-se às regras e métodos utilizados para determinar os valores praticados nas transações comerciais e financeiras entre empresas de um mesmo grupo que operam em jurisdições fiscais distintas. Essas transações podem envolver a troca de bens, serviços, ou a transferência de ativos intangíveis, como direitos autorais e marcas.
O objetivo principal do preço de transferência é garantir que essas operações entre empresas relacionadas sejam realizadas com base em condições semelhantes às que seriam acordadas entre partes independentes, ou seja, em conformidade com o princípio do “arm’s length” (preço de mercado). Isso assegura que a determinação dos preços não seja manipulada de forma a reduzir a base tributável em uma jurisdição, afetando a arrecadação fiscal.
O preço de transferência permite que as autoridades fiscais verifiquem se as transações internas entre empresas de um grupo multinacional estão sendo precificadas de forma justa e consistente com o mercado. Além disso, o preço de transferência também garante que as empresas adotem práticas comerciais transparentes, alinhadas às diretrizes internacionais, como as da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE).
O preço de transferência desempenha um papel fundamental no cálculo do Imposto de Renda da Pessoa Jurídica (IRPJ) e da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL) no Brasil, uma vez que estabelece as condições sob as quais as empresas devem calcular e declarar seus lucros. Quando empresas vinculadas realizam transações entre si, os preços aplicados nessas transações podem influenciar diretamente o valor da base de cálculo desses tributos. Se os preços praticados estiverem abaixo ou acima do valor de mercado, isso pode gerar uma redução ou aumento indevido da base tributável, afetando a quantia de IRPJ e CSLL a ser paga ao governo.
As novas regras de preços de transferência, estabelecidas pela Lei nº 14.596/2023, exigem que as empresas realizem suas transações com partes relacionadas de forma que os preços estejam em conformidade com o que seria praticado entre partes independentes. O não cumprimento dessas normas pode resultar em ajustes fiscais e penalidades, além de possíveis autuações da Receita Federal.
As principais alterações envolvem a definição de partes relacionadas e a aplicação de métodos de precificação mais flexíveis. Atualmente, o Brasil seguia um modelo de preços de transferência baseado em margens fixas e com algumas limitações nas comparações de transações internacionais.
A nova lei de preços de transferência propõe um pleno alinhamento com as diretrizes da OCDE, o que significa que o Brasil agora adota uma abordagem mais moderna e flexível. Isso inclui a utilização de comparáveis de mercado e a aplicação de métodos reconhecidos internacionalmente, como o Transactional Net Margin Method (TNMM) e o Profit Split Method (PSM).
Antes da mudança, o conceito de partes relacionadas era limitado principalmente às empresas que possuíam um vínculo direto de controle acionário. Agora, a definição foi ampliada, incluindo situações em que as empresas têm influência significativa umas sobre as outras, mesmo sem um controle acionário direto. Isso pode envolver empresas que compartilham o mesmo controlador ou que possuem interesses comerciais comuns.
O princípio arm’s length estabelece que os preços das transações entre empresas do mesmo grupo devem ser os mesmos que seriam praticados entre empresas independentes, ou seja, devem refletir as condições do mercado. Antes da reforma, o Brasil aplicava esse princípio de maneira parcial, com base em margens fixas e setoriais. Com a nova lei, o princípio arm’s length passa a ser a regra geral para todas as transações controladas, promovendo uma forma mais justa e precisa de determinar os preços e, consequentemente, a base de cálculo dos impostos.
Essas mudanças trazem a legislação brasileira mais próxima dos padrões internacionais, contribuindo para um ambiente de negócios mais transparente e equitativo, além de facilitar a interação com outros países, especialmente em termos de combate à evasão fiscal e à dupla tributação.
O objetivo da análise de comparabilidade é garantir que as transações entre empresas de um mesmo grupo (partes relacionadas) sejam tratadas da mesma forma que seriam se fossem realizadas entre empresas independentes. A análise consiste em comparar os termos e condições das transações controladas com os termos e condições que seriam aplicados entre partes independentes.
Para isso, existem alguns passos importantes a serem seguidos:
Na prática, envolve um processo detalhado de busca e avaliação de dados de transações. O contribuinte (ou a administração tributária) deve buscar as informações que melhor reflitam o que seria acordado entre partes independentes e considerar as particularidades de cada transação.
Por exemplo, se uma empresa brasileira realiza uma venda de software para uma filial em outro país, é necessário comparar essa transação com vendas similares realizadas por empresas independentes no mercado. Se não houver dados de vendas de software entre empresas independentes na mesma região, pode-se buscar transações internacionais com empresas similares, ajustando os dados conforme necessário para refletir as diferenças entre os mercados.
A nova lei de preços de transferência, por meio da MP 1152/22, formalizou o processo de análise de comparabilidade, detalhando os critérios a serem seguidos na comparação das transações controladas com transações entre partes não vinculadas. Entre os principais aspectos, destacam-se:
O teste de comparabilidade pode gerar questionamentos fiscais, principalmente em relação à identificação e seleção dos comparáveis. As autoridades fiscais podem argumentar que as transações selecionadas para comparação não são suficientemente semelhantes à transação controlada, ou que os critérios utilizados para escolher as comparações não são adequados. Em muitos casos, o intervalo de comparabilidade pode ser muito amplo, gerando incertezas que podem ser interpretadas de maneira diferente pelo Fisco. Para evitar esses questionamentos, é crucial que as empresas documentem minuciosamente os critérios utilizados e os dados das transações comparáveis, demonstrando que o processo foi conduzido de acordo com as melhores práticas internacionais, como as diretrizes da OCDE.
As mudanças trazidas pela Lei nº 14.596/2023 e pela MP 1152/22 terão um impacto direto nas estratégias tributárias das empresas. A principal alteração é a transição para um sistema baseado no princípio arm’s length, o que exige um maior controle e análise das transações intercompany. As empresas terão que revisar suas políticas internas de preços de transferência, garantindo que todos os acordos entre partes relacionadas estejam em conformidade com as novas exigências e com as práticas internacionais, como as da OCDE.
Isso pode afetar diretamente a alocação de lucros e a distribuição de impostos entre diferentes jurisdições fiscais, especialmente em empresas multinacionais. O planejamento tributário precisará ser mais rigoroso, focado na documentação e na seleção dos métodos de precificação adequados para cada transação. A nova legislação também pode resultar em maior transparência nas transações, exigindo que as empresas revisem suas estruturas de preços de transferência para evitar a transferência indesejada de lucros para jurisdições com tributação mais favorável.
Com as novas regras de preços de transferência, as empresas precisam revisar suas estruturas de preços e garantir que as transações entre subsidiárias, filiais ou outras partes relacionadas atendam ao princípio arm’s length. Isso inclui a escolha cuidadosa dos métodos de precificação, dependendo das características das transações.
Antes de implementar qualquer estratégia tributária, é fundamental que as empresas realizem um diagnóstico prévio das suas transações intercompany. Esse diagnóstico permite entender as transações realizadas entre as empresas do grupo e identificar possíveis riscos fiscais. A realização desse diagnóstico ajuda as empresas a entenderem melhor sua exposição tributária, especialmente em relação ao ajuste de preços de transferência, e proporciona uma visão clara sobre onde estão as oportunidades de otimização tributária.
As empresas devem começar a adotar tecnologias fiscais que ajudem na automação da conformidade tributária e na análise das transações entre partes relacionadas. O processo de adaptação deve ser gradual, com a revisão de contratos, sistemas de contabilidade e auditoria, para garantir que as mudanças sejam implementadas de maneira eficaz e eficiente.
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