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Creditamento de PIS/Cofins sobre o IPI não recuperável

A Instrução Normativa da Receita Federal nº 2.121, de 15 de dezembro de 2022, consolida, em um único corpo normativo, as normas atinentes à apuração, cobrança, fiscalização, arrecadação e administração do PIS e da Cofins. No entanto, a nova regulamentação das contribuições sociais não deixou de causar polêmica e insegurança jurídica. Vejamos uma delas, referente ao direito ao crédito de PIS e COFINS sobre o IPI não recuperável pelo adquirente revendedor.

Breve histórico normativo acerca do IPI não recuperável:

Antes de analisar a IN RFB nº 2.121/2022, é pertinente recapitular o tratamento dado à matéria pelas três instruções normativas anteriores que consolidavam as normas do PIS e da COFINS: a IN SRF nº 247/2002, a IN SRF nº 404/2004 e a IN RFB nº 1.911/2019.

Historicamente, as instruções normativas que regulavam o PIS e a COFINS não cumulativos em âmbito infralegal previam expressamente a possibilidade de desconto de créditos dessas contribuições sobre o Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) incidente na aquisição quando irrecuperável pelo adquirente (i.e., quando não fosse contribuinte do imposto e, portanto, não pudesse descontar crédito), caso em que passava a integrar o custo dos bens. Veja abaixo os dispositivos das instruções normativas que regulavam a matéria:

IN SRF nº 247/2002:

Art. 66. A pessoa jurídica que apura o PIS/Pasep não-cumulativo com a alíquota prevista no art. 60 pode descontar créditos, determinados mediante a aplicação da mesma alíquota, sobre os valores:

I – das aquisições efetuadas no mês:

a) de bens para revenda, exceto em relação às mercadorias e aos produtos referidos nos incisos III e IV do art. 19;

b) de bens e serviços utilizados como insumos na fabricação de produtos destinados à venda ou na prestação de serviços, inclusive combustíveis e lubrificantes;

b) de bens e serviços, inclusive combustíveis e lubrificantes, utilizados como insumos:

§ 3º O IPI incidente na aquisição, quando recuperável, não integra o custo dos bens, para efeitos do disposto no inciso I.

IN SRF nº 404/2004:

Art. 8º Do valor apurado na forma do art. 7º, a pessoa jurídica pode descontar créditos, determinados mediante a aplicação da mesma alíquota, sobre os valores:

I – das aquisições efetuadas no mês:

a) de bens para revenda, exceto em relação às mercadorias e aos produtos referidos nos incisos III e IV do § 1º do art. 4º;

b) de bens e serviços, inclusive combustíveis e lubrificantes, utilizados como insumos: b.1) na produção ou fabricação de bens ou produtos destinados à venda; ou b.2) na prestação de serviços;

§ 3º Para efeitos do disposto no inciso I, deve ser observado que:

I – o Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) incidente na aquisição, quando recuperável, não integra o valor do custo dos bens;

Em 2019, foi publicada a IN RFB nº 1.911/2019, que consolidou em um único corpo normativo as legislações do PIS e da COFINS, revogando as duas instruções normativas anteriores. Não obstante, foi mantido, expressamente, o direito ao desconto de créditos de PIS e COFINS sobre o IPI irrecuperável, nos termos do inciso II do art. 167:

Art. 167. Para efeitos de cálculo dos créditos decorrentes da aquisição de insumos, bens para revenda ou bens destinados ao ativo imobilizado, integram o valor de aquisição:

II – o IPI incidente na aquisição, quando não recuperável.

A possibilidade de creditamento sobre o IPI não recuperável era de entendimento pacífico na Receita Federal, que respondeu duas consultas de contribuintes confirmando o disposto nas instruções normativas:

Solução de Consulta Cosit nº 579, de 20 de dezembro de 2017:

ASSUNTO: CONTRIBUIÇÃO PARA O FINANCIAMENTO DA SEGURIDADE SOCIAL – COFINS. NÃO CUMULATIVIDADE. IPI NÃO RECUPERÁVEL. CREDITAMENTO. O IPI não recuperável integra o valor de aquisição de bens para efeito de cálculo do crédito da Cofins na sistemática não cumulativa. Dispositivos Legais: Lei nº 10.833, de 2003, art. 3º; IN SRF nº 404, de 2004, art. 8º, § 3º, I.

Solução de Consulta Cosit nº 105, de 28 de setembro de 2020:

ASSUNTO: CONTRIBUIÇÃO PARA O FINANCIAMENTO DA SEGURIDADE SOCIAL – COFINS. (…). Existe ainda a importadora por conta e ordem de terceiros a possibilidade de recuperar, a título de crédito, o valor relativo ao IPI vinculado à importação. Este último, portanto, não integra o custo de aquisição da mercadoria, e, por conseguinte, também não integra a base de cálculo de creditamento da Cofins-Importação pelo adquirente (encomendante), sendo, ainda, vedado o aproveitamento dos créditos da referida contribuição pela importadora por conta e ordem.

É importante que se diga que o crédito de IPI nesse caso era permitido, apesar dele não compor a base de cálculo do PIS e da COFINS, de acordo com o que já era previsto no art. 26, § 4º, I, da IN RFB nº 1.911/2019, que foi reproduzido pela IN RFB nº 2.121/2022 no art. 25, § 3º, I.

Do tratamento dado pela IN RFB nº 2.121/2022 ao IPI não recuperável:

Contudo, o art. 170 IN RFB nº 2.121/2022 alterou o tratamento do IPI para fins dos créditos de PIS e COFINS ao prever que o IPI incidente na aquisição de mercadorias não compõe o crédito das contribuições, sem excepcionar o IPI irrecuperável. É o que dispõe o art. 170 da referida instrução normativa:

Art. 170. As parcelas do valor de aquisição dos itens não sujeitas ao pagamento da Contribuição para o PIS/Pasep e da Cofins não geram direito a crédito, tais como:

II – o IPI incidente na venda do bem pelo fornecedor; e

Uma leitura atenta do caput do art. 170 permite concluir que o dispositivo divide o valor de aquisição em medidas menores (as parcelas), que, se não estiverem sujeitas ao pagamento do PIS e da COFINS, não geram o direito ao crédito, a exemplo do IPI incidente na venda, que é excluído da base de cálculo das contribuições conforme o art. 25, § 3º, I, da IN RFB nº 2.121/2022.

Na lógica desse dispositivo, a partir do valor total da nota fiscal de venda, segrega-se aquilo que corresponde à mercadoria (sujeita ao PIS e à COFINS) do IPI destacado (não sujeito ao PIS e à COFINS). Assim, estaria sendo aplicada a técnica da não cumulatividade. Porém, ao assim fazer, a instrução normativa incorreu em ilegalidades, em detrimento do entendimento manifestado em duas soluções de consulta, que podem ser questionadas com medidas judiciais. É o que se passa a analisar.

Da ilegalidade do art. 170, II, da IN RFB nº 2.121/2022:

O crédito de PIS e COFINS sempre foi calculado com base no “valor do item”, nos exatos termos dos incisos do § 1º do art. 3º das Leis nº 10.637/2002 e nº 10.833/2003. Dessa forma, o IPI destacado na nota fiscal de venda integra não só o valor do item, mas também o custo de aquisição, pois está embutido no preço de venda da mercadoria. Se assim é, deve compor a base de cálculo dos créditos de PIS e COFINS.

Portanto, os contribuintes devem se atentar a essa alteração promovida pela Receita Federal à revelia da lei, pois viola o art. 3º das leis do PIS e da COFINS ao restringir o direito ao crédito das contribuições a determinadas parcelas listadas no dispositivo. Assim, a medida judicial pode ser o melhor caminho para o contribuinte se certificar da correta aplicação da lei.

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Ulisses Pizzolatti

Especialista tributário do Tax Group. Bacharel em Direito pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). Bacharel em Administração pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS). MBA Executivo em Direito — Gestão e Business Law pela Fundação Getúlio Vargas (FGV). Pós-graduado em Gestão de Tributos e Planejamento Tributário Estratégico pela PUCRS.

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